Passada a folia, surgem vários balanços e avaliações de aspectos negativos e positivos da festa. Do ponto de vista ecológico e sustentável também não é diferente: a quantidade de material potencialmente reciclável que não vai mais parar nas praias, córregos e aterros em Salvador ou municípios vizinhos. Mais de 30 toneladas de resíduos sólidos retiradas dos circuitos da festa, notadamente latinhas de alumínio, garrafas pets e embalagens plásticas. Todo esse material foi recolhido por catadoras e catadores cooperados e/ou avulsos que participaram do Projeto Eco Folia Solidária: o Trabalho Decente Preserva o Meio Ambiente, edição 2019. Há dezesseis anos o Projeto, capitaneado pelo Complexo Cooperativo de Reciclagem da Bahia / CCRBA, envolve instituições públicas do estado e município e também iniciativa privada, além de organizações da sociedade civil.
Michele Almeida, presidenta do CCRBA, se mostrou otimista com os números: “É o resultado de muitos anos de trabalho e dedicação. A gente acredita e faz nossa parte. Nem bem terminou e estamos pensando no próximo carnaval. É preciso planejar espaço das centrais, equipes de trabalho, local para asseio e alimentação dos catadores, fardamento adequado, e tantas outras coisas desde já. É uma logística gigantesca pensada pra que a gente consiga ter condições, cada vez mais, de destinar corretamente o resíduo potencialmente reciclável. Ao final dos trabalhos, com a pesagem de todo material retirado das nossas 4 centrais, pensamos uma estimativa de 25 mil toneladas”, afirmou confiante a presidente.
Joilson Santana, integrante do Centro de Arte e Meio Ambiente – CAMA organização apoiadora do projeto desde o ano de 2004 e coordenador do Projeto Cuidar Cidades: Nossa Casa Comum apoiado pelo Fundo Socioambiental CASA, explanou que nessa edição do Projeto um diferencial importante foi a atuação de instituições públicas representadas pelo Ministério Público do Estado, Defensoria Pública do Estado e Ministério Público do Trabalho. “Foram muitas reuniões, exposição de demandas das catadoras e catadores e em alguns momentos foi necessário fazer valer a caneta. Nem todos os pontos de nossa pauta foram atendidos, tivemos descumprimentos com as atividades já acontecendo nas ruas e tudo isso já está agendado para discussão com essas instituições com as quais estreitaremos os laços de forma mais incisiva a partir desse ano, buscando a aplicação da Lei 12.305 no que caberia aos governos federal, estadual e municipal, além da iniciativa privada. Não dá pra continuarmos assim, passando alguns apertos, realizando o trabalho da importância que fazemos, sem todo o apoio, a atenção e os investimentos necessários que a atividade merece”, desabafou o coordenador.
A oportunidade que também se encontra na catação dos resíduos
Vem gente de bairros distantes ao circuito, vem gente de outros municípios seja da região metropolitana ou não. Catadoras e catadores avulsos muitas vezes, aqueles que enxergam na atividade um incremento da renda, outros que catam onde vivem, mas entendem que o carnaval e outras festas de rua na capital geram grandes volumes de resíduos. A presidente do CCRBA, Michele Almeida, destacou a preocupação em atender esse público: “Foi realizado cadastro, como todos os anos, desses trabalhadores avulsos, como chamamos. Essa edição do Eco Folia não fomos contemplados em todas as solicitações feitas sobre local para asseio e descanso dos trabalhadores em todas as centrais, por exemplo. Conseguimos somente um dos 3 locais pedidos para que os agentes pudessem almoçar. Algumas situações descumpridas pelos poderes públicos, ocorrências já agendadas no Ministério Público do Trabalho, inclusive. Mas as pessoas chegam e vêm dispostas a trabalhar e mostram serviço todos os dias da festa. Repassamos o fardamento, com botas, meias, luvas, protetores auriculares, camisas e calças e garantimos as três refeições e água. Somos aguerridos!”, pontuou Almeida.
Personagens da vida real como seu Ronaldo Pereira Bispo, 43 anos, morador de Simões Filho, quase 30 km de distância da Folia Momesca. Ele fez o percurso durante todos os dias de trabalho e viu na catação uma oportunidade de aumentar a renda. “Tenho outras profissões. É uma história que está sendo inusitada em minha vida. Uma pessoa me indicou e estou sendo muito grato por ter conhecido essa família de reciclagem, tá sendo uma experiência inovadora em minha vida, muito legal, e realmente quero parabenizar os envolvidos”, relatou no breve descanso após o almoço servido do Espaço de Convivência Maria Lúcia Pereira, centro que atendia aos trabalhadores da Central localizada na Ladeira da Montanha. Seu Ronaldo contou, ainda, que fez “um bom movimento” e apesar do cansaço e da novidade da lida, estava muito satisfeito e tinha planos de continuar na atividade.
Dona Rosana Santana Barbosa, 44 anos, moradora de Colinas de Periperi, também entende a oportunidade de implementar a renda, mas ressalta o sentimento das ruas em alguns momentos: “Nem todos respeitam o catador. Nem todo mundo trata a gente igual, entendendo que o que a gente faz é importante pra festa. As pessoas precisam valorizar mais a gente. Um aumento no valor do resíduo também nera mal, não. Isso traria mais dignidade pra gente”, desabafou dona Rosana.
O Projeto Eco Folia Solidária é uma iniciativa de organizar e melhorar as condições de trabalho e renda dos catadores e catadoras de materiais recicláveis durante o carnaval de Salvador. Surgiu em 2004 pelo Complexo Cooperativo de Reciclagem da Bahia em parceria com a então Delegacia Regional do Trabalho na Bahia – DTR/Ba e o Centro de Arte e Meio Ambiente - CAMA. Após essa mobilização, sobretudo nos últimos anos, outras ações surgiram também para pautar melhorias para ações desenvolvidas por esses trabalhadores. Para essa edição, A ideia da coordenação do CCRBA é cadastrar essas catadoras e esses catadores avulsos e a estimativa é atender, 400 deles, garantindo EPIs (bota, luva e protetor auricular), fardamento (camisa, calça e meia) e refeições (café da manhã, almoço e café da noite) durante os dias de trabalho e estabelecer melhor remuneração pelo material coletado e entregue nas centrais de apoio ao catador. Além desses avulsos, mais 112 trabalhadores cooperados irão garantir que os resíduos potencialmente recicláveis tenham destinação correta.
O Projeto Eco Folia Solidária - O Trabalho Decente Preserva o Meio Ambiente 2019, contou com o patrocínio do Governo do Estado da Bahia, através da Secretaria Estadual do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte - SETRE e a Secretaria Estadual do Meio Ambiente - SEMA e a empresa AMBEV. E apoio do Centro de Arte e Meio Ambiente - CAMA, Fórum Baiano de Economia Solidária, Movimento da População em Situação de Rua, Ministério Público do Estado, Defensoria Pública do Estado, Ministério Público do Trabalho e a Prefeitura Municipal de Salvador.
Rai Trindade – Assessoria de Comunicação
ASCOM DO CCRBA